Professor queniano de escola rural vence o ‘Nobel da Educação’ de 2019
Saiba mais sobre a trajetória de Peter Tabichi, que ensina matemática e física em uma escola com 1 computador para cada 58 alunos; Brasileira é top 10
por Vinícius de Oliveira 24 de março de 2019
Peter Tabichi, professor de matemática e física na escola rural de ensino fundamental Keriko Secondary School, em Nakuru, no Quênia, foi o vencedor do Global Teacher Prize, o “Nobel da Educação”, e leva o prêmio de US$ 1 milhão concedido pela Varkey Foundation. O anúncio foi feito neste domingo (24) durante o Global Education and Skills Forum, o Fórum Mundial de Educação e Competências (em tradução livre), que acontece em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos. A professora brasileira Débora Garofalo ficou entre os 10 finalistas.
A educação está no sangue de Tabichi, de 36 anos. Filho de pai professor e com primos que também seguem a profissão, ele usa tecnologia para ensinar em uma escola com baixíssima conectividade (um computador para cada 58 alunos). Seus alunos precisam caminhar 7 km por estradas acidentadas para assistir às aulas.
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“Todos os dias na África viramos uma nova página e um novo capítulo. Hoje é outro dia. Este prêmio não reconhece só a mim, mas reconhece os jovens deste grande continente”, disse o professor ao receber o troféu dourado. “Só estou aqui por conta de tudo o que meus alunos conquistaram”
“Como professor que atua em sala de aula, vejo a curiosidade, o talento, a inteligência e a perseverança. Os jovens de África deixarão de ficar para trás por conta de baixas expectativas. A África produzirá cientistas, engenheiros e empreendedores cujos nomes serão um dia famosos em todos os cantos do mundo. E as meninas serão uma grande parte dessa história”.A África produzirá cientistas, engenheiros e empreendedores cujos nomes serão um dia famosos em todos os cantos do mundo. E as meninas serão uma grande parte dessa história
“Acredito que a ciência e a tecnologia podem desempenhar um papel de liderança no desbloqueio do potencial da África. Todos sabemos que as descobertas científicas e as inovações estimulam o progresso, facilitam o desenvolvimento e podem resolver questões como insegurança alimentar, escassez de água e mudança climática. É de manhã na África. O céu está claro. É um novo dia e há uma página em branco esperando para ser escrita. Esta é a vez da África”.
Da mesma maneira que professores vencedores nas edições anteriores do Global Teacher Prize, Tabichi é mais que um educador em sala de aula. Ele doa 80% de seu salário para os menos favorecidos. Antes de embarcar a Dubai, o professor declarou que sonhava ganhar o prêmio para ampliar iniciativas como o clube de ciências, além de fomentar competições e montar um laboratório de informática com conectividade na escola.
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Contexto
A região onde o professor Peter é muito pobre. Habitantes de Nakuru sofrem com a seca e a fome. Cerca de 95% dos alunos são oriundos de famílias pobres, quase um terço são órfãos ou têm apenas um dos pais, sendo que muitos não têm comida em casa. São comuns os casos de abuso de drogas, gravidez na adolescência, evasão escolar, casamentos entre jovens e suicídio.
Assista ao vídeo sobre o trabalho do professor Peter Tabichi
Superação
Tabichi lançou um clube de formação de talentos e expandiu o clube de ciências da escola, ajudando os alunos a desenvolver projetos de pesquisa de tal maneira que, atualmente, 60% se classificaram para competições nacionais. Peter também orientou seus alunos a participar da Feira de Ciências e Engenharia do Quênia, em 2018 – onde eles apresentaram um dispositivo que inventaram para permitir que pessoas cegas e surdas consigam medir objetos. O esforço deu resultado e Peter viu a sua escola da aldeia alcançar o primeiro lugar nacional na categoria de escolas públicas. A equipe de ciências matemáticas também se qualificou para participar da edição de 2019 da Feira Internacional de Ciências e Engenharia promovida pela INTEL, no Arizona, nos Estados Unidos, para a qual eles estão atualmente se preparando. Seus alunos também ganharam um prêmio da entidade de pesquisa britânica Royal Society of Chemistry por aproveitarem plantas locais para gerar eletricidade.
Preocupação com todos
O professor Tabichi e quatro colegas também oferecem aos alunos de baixo rendimento aulas particulares de matemática e ciências no contraturno e durante os finais de semana. Neste caso, o professor vai até a casa dos estudantes e conhece suas famílias para identificar as dificuldades que eles enfrentam. Apesar de lecionar em uma escola com apenas um computador desktop com uma conexão intermitente, Tabichi costuma usar tecnologia na maior parte de suas aulas para engajar os alunos. Para superar a baixa conectividade, ele vai até cybercafés e baixa o conteúdo para usar em aula no modo off-line.
Ao fazer seus alunos acreditarem em si mesmos, Tabichi melhorou drasticamente o desempenho e a autoestima de seus alunos. O número de matrículas dobrou para 400 em três anos, e os casos de indisciplina caíram de 30 por semana para apenas três. Em 2017, apenas 16 dos 59 alunos ingressaram em faculdades, enquanto que, em 2018, esse número subiu e 26 alunos foram para universidades e faculdades. O desempenho das meninas, em particular, foi impulsionado e fez com que elas superassem meninos em quatro provas realizadas no ano passado.
Brasileira no TOP 10
Pela terceira vez consecutiva o Brasil teve representante entre os 10 melhores. A professora brasileira Débora Garofalo, que leciona matérias de tecnologia e robótica na EMEF Almirante Ary Parreiras, em São Paulo (SP), ficou perto de levantar o trofeu.
Ao longo dos três dias do congresso, os professores finalistas são convidados a apresentar uma aula de demonstração. Veja como foi a apresentação de Débora
Em suas aulas com estudantes de 6 a 14 anos, a professora usa material de sucata e busca fomentar o protagonismo do aluno a partir da aprendizagem criativa, das experiências e conhecimentos prévios dos alunos e do uso reflexivo das tecnologias.
Uma mostra deste trabalho pode ser encontrada no relato que a professora Débora Garófalo enviou ao Porvir em 2016 e foi publicado na seção Diário de Inovações. “Quando assumi a sala de informática, os alunos só queriam jogar, mas com o passar do tempo, mostrei pra eles que o laboratório tem outras finalidades, e que o computador não é um instrumento final, mas faz parte do processo”, contou a professora.